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Parceria entre Stahelski e Reeves atinge seu ápice em John Wick 4: Baba Yaga

Se assistirmos a qualquer um dos filmes da agora quadrilogia ‘John Wick’ veremos, inevitavelmente, personagens falando sobre a importância de seguir as regras, mesmo se tratando de membros de organizações criminosas, operando em completa oposição às leis comuns. Uma frase que ficou famosa sendo repetida em mais de um dos episódios de Wick é que ‘sem as regras, viveríamos como os animais.’ Nesse sentido, o personagem de Keanu Reeves só encontra razão de ser enquanto antítese das regras, sendo eternamente perseguido pelas consequências de jogar fora das quatro linhas desenhadas pela Alta Cúpula.

No quarto e talvez último episódio de Wick, o diretor Chad Stahelski refina o equilíbrio de seu filme anterior, mas desta vez a dinâmica e o ritmo não são pautados apenas pela mudança do espaço físico – a diferença urbana de grandes metrópoles como Nova Iorque,Berlim e Paris é pequena do ponto de vista da ação – e sim pelo olhar amadurecido do cineasta que aproveita melhor do que nunca os espaços entre cenas de ação para capturar momentos de reflexão e acrescentar peso dramático aos seus personagens sem a necessidade imediata de diálogos.

Se de um lado os diálogos entre personagens não passam do mínimo necessário para compreensão básica da trama – que já não é nada complexa, afinal se trata de um blockbuster, de outro a ação de John Wick 4 é maximizada e cresce com as novas experimentações visuais de Stahelski, com destaque para o plano-sequência filmado de cima em um prédio abandonado. Dessa maneira, o diretor consegue manter o nível da ação sem cansar o espectador, pois cada sequência aproveita o máximo do seu ambiente – do encontro completamente alucinado com o personagem de Scott Adkins em Berlim à simplicidade de uma escadaria parisiense.

Apesar de ter uma base sólida de influências de diretores como Walter Hill, com direito à referência explícita ao filme Os Selvagens da Noite (1978), a presença de Donnie Yen, veteraníssimo do cinema de ação de Hong Kong, ajuda também a trazer elementos de uma das escolas de ação mais influentes do planeta. Seu estilo inconfundível de Kung-Fu contribui com fluidez nos combates, mas uma de suas melhores cenas acontece em um dos raros momentos de suspensão da ação, ao encontrar o personagem de Reeves antes do grande duelo – uma cena à luz de velas em uma igreja que ecoa O Matador (1989), clássico de outra figura importante do cinema de ação de HK, John Woo. No entanto, enquanto no filme de Woo o personagem de Danny Lee Sau-Yin pede ao de Chow Yun-Fat para não matar, em John Wick 4 os personagens de Reeves e Yen já resignaram: a violência é a única saída, desde que esteja dentro das regras da Alta Cúpula.

Após passar tanto tempo fugindo das consequências dos seus atos, faz todo o sentido que neste suposto capítulo final da saga Wick tente encontrar uma saída ‘dentro do livro’. Nesse sentido, acontece outro ato de resignação: não é possível viver em fuga para sempre e apesar da vitalidade, o tempo já não está mais a seu favor. Com um duelo de faroeste clássico acompanhado de uma fotografia que remete às experimentações CGI de Paul W.S. Anderson, John Wick 4 fecha a saga no ponto mais alto de Paris, a Basílica de Sacré Cœur e coincidentemente no ponto mais alto da cinematografia de Stahelski. Um descanso aliviado, mesmo que temporário, para o personagem de Keanu Reeves, que apesar de colecionar mortes, insiste em carregar o peso da única pela qual não é responsável.

John Wick 4: Baba Yaga está em cartaz nos cinemas.

Texto por André Fernandes