Anvisa nega pedidos de importação da Sputnik V por Estados

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) negou nesta segunda-feira (26) a autorização para a importação da vacina russa Sputnik V por dez Estados. Em reunião extraordinária, a diretoria colegiada da agência rejeitou por unanimidade o pedido e embasou sua decisão na falta de dados básicos para análise do produto e em falhas identificadas pela área técnica da Anvisa que podem comprometer eficácia, segurança e qualidade do produto.

A reunião foi convocada frente ao fim do prazo de 30 dias definido pela lei 14.124/2021 e confirmado pelo Supremo Tribunal Federal para que a Anvisa avaliasse os pedidos de importação de vacinas contra a covid-19 feitos por governos estaduais e municipais. Ao menos 14 Estados e 2 municípios solicitaram a importação, mas a análise feita pela agência nesta segunda referiu-se ao pedido de importação de 29,6 milhões de doses por dez Estados: Bahia, Acre, Rio Grande do Norte, Maranhão, Mato Grosso, Piauí, Ceará, Sergipe, Pernambuco e Rondônia.

Os cinco diretores seguiram a recomendação das três áreas técnicas envolvidas na avaliação: as gerências de medicamentos/produtos biológicos, fiscalização e monitoramento, que defenderam a não autorização da importação. Os servidores apontaram a falta do relatório técnico da vacina e uma série de falhas nos estudos e processos produtivos do imunizante.

Sem receber dos Estados os dados básicos do imunizante, a agência brasileira pediu informações às autoridades russas e de países que já utilizam a vacina, como Argentina e México, e encontraram irregularidades no produto.

Um dos problemas mais graves apontados foi a identificação em lotes da vacina de adenovírus que podem se replicar nas células humanas. O adenovírus é usado como um vetor que leva o material genético do coronavírus ao indivíduo vacinado, mas deve estar “inativado”, sem a capacidade de se replicar e provocar doença.

“Verificamos a presença de adenovírus replicante em todos os lotes. Isso é uma não-conformidade grave e está em desacordo com o desenvolvimento de qualquer vacina de vetor viral. A presença de um adenovírus pode ter impacto na nossa segurança quando utilizamos a vacina”, destacou Gustavo Mendes, gerente-geral de medicamentos e produtos biológicos da agência.

Ele apresentou ainda outros problemas da Sputnik, como falhas no protocolo dos estudos clínicos. O especialista afirmou que, pelos dados disponíveis, não foi possível verificar de que forma os participantes dos testes clínicos reportavam eventos adversos e eram monitorados quanto a eventuais reações. Também foram encontradas falhas nas análises que investigaram se eventos adversos graves tinham relação com a vacina.

Mendes destacou ainda que não foi apresentado perfil de segurança da vacina por faixa etária ou por presença de comorbidades. Ele destacou que outras vacinas que usam a mesma tecnologia de vetor viral (como a de Oxford/AstraZeneca) podem provocar efeitos colaterais, como trombose, e essas reações, ainda que raras, precisam ser conhecidas para que a informação esteja detalhada na bula.

O gerente-geral de medicamentos frisou ainda que os estudos clínicos foram realizados com lotes produzidos em escala laboratorial, e não industrial, o que compromete a análise do comportamento do produto fabricado em larga escala.

O servidor também destacou que os dados apresentados para a revista científica The Lancet, onde o artigo sobre o estudo da Sputnik V foi publicado, não são suficientes para uma aprovação por agência regultória. “Avaliação sanitária é diferente da feita por uma revista científica. A sanitária precisa ter acesso a todos os dados brutos”, disse ele, ressaltando que, sem os dados completos, é impossível validar a metodologia e as conclusões dos testes clínicos.

No campo da fiscalização das fábricas do produto, a gerente-geral da área, Ana Carolina Marino, destacou que a inspeção in loco na Rússia não ocorreu de forma ideal porque os servidores da Anvisa foram impedidos de entrar em algumas instalações, como no Instituto Gamaleya, desenvolvedor do produto.

A inspeção foi feita apenas em duas plantas terceirizadas pela Rússia para produção da vacina pronta e do ingrediente farmacêutico ativo (IFA) e, de acordo com a diretora, não foi possível garantir a qualidade do processo produtivo nesses espaços.

Por fim, a gerente-geral de monitoramento, Suzie Marie Gomes, destacou que análises das informações de estudos clínicos, do processo produtivo e de países que já utilizam a Sputnik, como a Argentina, mostraram problemas em vários aspectos do desenvolvimento e fabricação do imunizante e no monitoramento da aplicação do imunizante após a aprovação. Para a servidora, os problemas “não permitem garantir que o produto seja seguro para a população brasileira”.

O diretor relator do caso, Alex Machado, acolheu os argumentos das áreas técnicas e manifestou especial preocupação com a identificação do adenovírus replicante na vacina. “A própria vacina foi desenvolvida para que o adenovírus não se replique. A presença de adenovírus replicante diverge do perfil de qualidade das vacinas de vetor viral”, destacou.

“As incertezas em relação à qualidade e segurança da vacina podem trazer agravos na saúde das pessoas, que estão saudáveis ao se vacinar e buscam na imunização a proteção contra a infecção pelo vírus sem esperar reações adversas”, completou.

A diretora Meiruze Freitas também destacou as incertezas sobre a segurança do produto ao defender a não autorização da importação “Os adenovírus podem causar infecções humanas como infecções leves no trato respiratório ou gastrointestinais. No entanto, as infecções por adenovírus podem ser fatais em pessoas imunocomprometidas, pessoas com distúrbios respiratórios ou em cardíacos pré-existentes”, destacou.

Os diretores destacaram que os dados exigidos eram os mínimos esperados para análise e que, mesmo assim, não foram entregues. Meiruze ressaltou que o primeiro pedido de uso emergencial, feito pelo laboratório União Química, parceira da Rússia no fornecimento da vacina ao Brasil, foi submetido em janeiro e, até hoje, os documentos faltantes solicitados pela Anvisa não foram entregues.

A diretoria também negou críticas de falta de sensibilidade da agência ou excesso de burocracia na decisão de não aprovar a vacina. “Nada é maior do que a missão de uma instituição. (A Anvisa) Não pode fechar os olhos aos riscos explicitamente referenciados”, declarou Antônio Barra Torres, diretor-presidente da agência.

A diretoria colegiada destacou que a decisão foi tomada com base nos dados disponíveis neste momento e que nova avaliação do produto poderá ser feita caso informações mais detalhadas sejam entregues.

Os responsáveis pela Sputnik V afirmaram na página oficial da vacina no Twitter ter compartilhado com a Anvisa “todas as informações e documentações necessárias, muito mais do que o utilizado para homologar a Sputnik V em 61 países”. A publicação sugere ainda que a decisão da agência regulatória brasileira pode ter sofrido influência dos Estados Unidos, rival político da Rússia. A hipótese é rechaçada pela Anvisa.

O governador do Ceará, Camilo Santana (PT), declarou, após a conclusão da reunião da Anvisa, que, embora respeite a decisão da agência, não poderia deixar de expressar sua “decepção e estranheza, pelo fato da mesma vacina já ser usada em muitos países, e com eficácia demonstrada”.

O político disse ainda que “o próprio Comitê Científico do Nordeste se posicionou favorável ao uso da Sputinik V” e que continuará “lutando por essa autorização, de forma segura e seguindo todas as regras, para podermos trazer a vacina para nossa população o mais rápido possível”.

Durante a reunião, os diretores da Anvisa destacaram que a maioria das nações que autorizaram o uso do imunizante não têm sequer estrutura regulatória robusta e que em mais de 20 dos 61 países que aprovaram o imunizante, o produto não está em uso.

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Priscilla Patitucci é a nova CEO da Anna Medicina Endocanabinoide

A Anna Medicina Endocannabinoide, startup que nasceu para facilitar o acesso dos brasileiros à cannabis medicinal e que conta atualmente com os primeiros espaços físicos destinados ao tema no país, passa a contar com Priscilla Patitucci como nova CEO. A executiva terá a missão de oferecer um olhar integrativo a médicos e pacientes que queiram conhecer mais sobre essa nova medicina.

“Como representante da Anna, pretendo trazer para a empresa uma alma de acolhimento e viabilização da saúde, promovendo informação, acesso, medicação e um acompanhamento com profissionais qualificados que entendam sobre os efeitos do canabidiol no corpo humano. Tudo isso para que nossos especialistas consigam dar para o paciente um tratamento de qualidade, indo além do paliativo”, comenta Patitucci. “A tríade formada entre Anna, PUCMed e ACURA vai permitir um ecossistema perfeito, criado para democratizar a medicina endocanabinoide”, complementa.

Pricilla Patitucci é bacharel em Direito e Psicologia, especialista em Terapia Comportamental, pós-graduada em Neurociência e Comportamento e possui MBA em Endocanabinologia e Cannabis para fins medicinais. Atua desde 2017 com atendimento clínico e indicação de medicamentos à base de canabis e, como mãe de autista, fundou em 2019 a ACURA — Associação Canábica Unidos em Razão do Amor, que oferece apoio completo às famílias, desde a busca de um médico até a compra do óleo.

Sobre a Anna Medicina Endocannabinoide

A Anna Medicina Endocannabinoide nasceu em 2022 para facilitar o acesso dos brasileiros à cannabis medicinal. Atualmente, conta com um marketplace com linhas de produtos próprios e de parceiros nacionais e internacionais e, recentemente, lançou os primeiros espaços físicos sobre o tema no país: na Santa Casa de Curitiba, hospital referência no Estado, e no Eco Medical Center, um ecossistema completo de clínicas e serviços médicos. A expectativa é atender mais de 12 mil pessoas até 2024.

Telemedicina surge como aliada no tratamento de crianças com autismo

Estudos realizados pela Universidade da Califórnia em Davis, nos Estados Unidos, sugerem que crianças com autismo cujos pais foram treinados para estimular o desenvolvimento dos filhos apresentaram um melhor avanço cognitivo. Neste quesito, o acesso facilitado ao sistema de saúde, ofertado pela telemedicina, pode ser um grande aliado – desde o diagnóstico até o tratamento.

“Na telemedicina, assim como no consultório físico, é fundamental estar atento a diversos comportamentos do paciente para identificar a presença do autismo”, explica o Dr. Edson Félix de Jesus, psicólogo da Docway (CRP 03/24967), empresa pioneira em soluções de saúde digital no Brasil. “Geralmente, a família chega na consulta online com outras queixas, como o TDAH, e ao longo do atendimento vamos identificando esses comportamentos em conjunto”, diz.

Em caso de suspeita da condição, o tratamento engloba todo o contexto familiar e relações interpessoais do paciente. “É essencial que a família esteja preparada para dar suporte à criança fora da consulta e que saiba identificar comportamentos disfuncionais. Caso o ambiente não responda de acordo com as sugestões do psicólogo, não há progresso no tratamento”, aponta.

Segundo ele, um ambiente desregulado, com demasiados conflitos e desrespeito aos limites da criança, é o principal responsável por reforçar comportamentos disfuncionais em pacientes com autismo, como a birra e a agressividade. “Precisamos instruir os responsáveis de que o autismo é uma condição diferenciada do neurodesenvolvimento, a qual o paciente precisa receber um olhar humanizado”, enfatiza.

Em relação à telemedicina, o psicólogo ressalta que é possível tratar pacientes com autismo de grau leve e moderado de forma semelhante à presencial. “Tudo depende de como o paciente responde. Em casos mais severos, quando o paciente não consegue criar vínculo, é importante encaminhar para o atendimento presencial e multidisciplinar, com auxílio de pediatra, neurologista, terapeuta ocupacional e educador físico”, comenta.

Ele também destaca a importância de começar o tratamento o mais cedo possível. “Quanto mais novo o paciente é, mais fácil é administrar os comportamentos disfuncionais e ensinar novas habilidades”, complementa o Dr. Edson Félix de Jesus.

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